segunda-feira, 10 de junho de 2013

A outra face da Lua ( mini conto)

Desconheço o tamanho do universo. Esse imenso espaço estelar maior do que tudo e ao mesmo tempo tão pequeno para ser compreendido. Talvez sejamos nós pequenos demais para compreender tamanha ousadia da natureza. Estamos longe de alcançar os desígnios de Deus ( ou de qualquer outra entidade superior). Ainda ontem, dei por mim a observar aquele luar que só se levanta em Janeiro.... mas curiosamente, não estávamos em Janeiro.
Todas aquelas estrelinhas salpicavam um céu não negro mas nenhuma delas, em todo o seu esplendor, brilhava mais do que a Lua. E perdi-me por alguns minutos, em todo aquele vestido de luz resplandecente. Queria, no entanto, afastar da minha mente uma certa nostalgia com que algumas lembranças me brindaram iluminadas pelo mesmo astro que eu observava com ternura. Porém´era completamente inevitável. Qualquer esforço que eu fizesse para o evitar tornava-se numa insignificante tentativa frustrada. Creio que talvez se tratasse de um golpe de ousadia do meu subconsciente. Nunca consigo controlar o ritmo das minhas memórias. Elas chegam e entram em cena sem nunca pedirem licença nem se fazerem anunciar.


Já foi há tanto tempo, e no entanto, lembro-me como se toda a infância tivesse sido ontem. É curioso como que à medida que vamos crescendo damos mais valor ao que deixamos nos recantos apagados do nosso passado. Aquela Lua em toda a sua magnanimidade e resplandecência transportava-me para as minhas muitas noites passadas na Quita da Vila-Nova e acaba também por me relembrar muitas das minhas questões de criança. Era curiosa demais, espevitada de mais, humana demais... ( acho que todas as crianças são assim, faz parte da sua natureza ainda pura no auge da ingenuidade).
Eu achava a quinta um lugar incrível. Havia animais por todo o lado, campos a perder de vista e debaixo de um velho e frondoso carvalho estava o meu baloiço. Construído de forma rudimentar com o auxilio de duas cordas e de um velho pneu. Um pequeno luxo para quem adorava sonhar todas as tardes com o embalar daquele baloiço, imaginando ser a própria Alice, num qualquer País das Maravilhas criado a preceito e com o privilégio de ter como hino, o canto dos pássaros.


E foi ao regressar de uma dessas muitas viagens de sonho imaginárias que aterrei bruscamente no chão. Um grito, seguido de choro insistente levou a minha avó de encontro a mim em poucos segundos. Pegou-me ao colo tentado consolar-me, depois de verificar que teria sido apenas um susto. A princesinha estava inteira e pronta pra outra assim que as lágrimas cessassem. Entretanto o sol despedia-se lá no horizonte e deixava o céu com labaredas de cor a recortar os montes. Mas eu era completamente alheia a toda esse espectáculo...continuava a chorincar. Coisas de criança que adora reclamar atenção para os seus pequenos dramas, que no seu entender, são demasiado importantes para se prestar atenção em simples pores do sol que, alias, acontecem todos os dias.

Entramos. Ela sentou-me na velha poltrona e saiu. Os poucos minutos que esteve ausente pareceram uma eternidade. Quando voltou trazia um livro enorme nos braços. Pousou-o em cima da mesa e preparou-me um copo de leite. Em seguida pegou-me ao colo deu-me o copo de leite morno para as minhas mãos, que funcionou como anestesiante para a minha caprichosa dor. Começou a folhear o livro, narrando uma historia engraçada sobre uma menina como eu. Hoje sei que tal historia era fruto do seu incondicional amor, pois aquelas páginas albergavam lindas ilustrações e muitas outras palavras que ela não leu, simplesmente porque não as reconhecia. Mas isso são apenas pormenores que pequena importância, que em nada diminuíam a fabulosa historia. Cada uma daquelas palavras ainda permanece em mim, e creio que se fechar os olhos ainda de oiço a ternura da voz nas ultimas palavras....

- ...então a menina deitou-se debaixo daquela velha árvores cheia de sonhos e viu a lua gigante por cima da sua cabeça. Mas estava com tanto sono que lhe pediu um beijo de boa noite e enquanto fechava os olhos sentiu o leve toque da brisa no seu rosto, que lhe entregou o esperado beijo dos sonhos.

- Avó, porque é que a Lua brilha tanto se o céu é tão escuro?

- vou contar-te um segredo. A lua acende-se de noite porque as estrelas têm medo de guardarem a noite sozinhas. Tal como tu precisas da luz acesa para espantares os teus medos de dormir... e sabes porque brilha tanto? Porque dentro da Lua vivem muitos sóis pequeninos. Eles acordam todas as noites e abrem as janelinhas dos seus quartos para que a Lua toda se ilumine e se erga no céu.

E enquanto fecho o livro, uma gotinha de sentimento escorre dos meus olhos brilhantes de saudade banhando a capa já marcada pelo tempo.
Olho a Lua cheia de sóis pequeninos uma ultima vez, e creio que hoje também tu serás uma dessas estrelinhas que a Lua recolhe em seu regaço ou talvez mores na própria Lua, só pelo simples facto de te ver sempre que olho para ela.



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